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Isabel

Foto do escritor: Entre PilaresEntre Pilares

Atualizado: 3 de set. de 2021


"Ao chegar o tempo próximo da quadra natalícia, a jovem Isabel, que gostava de se presentear anualmente com um mimo, encontrava-se angustiada. Sentia que algo estava a mudar no seu quotidiano. Apesar de identificar diversas possibilidades que lhe seriam úteis e do seu agrado, constatou que este ano não sentia magnetismo pelo materialismo. Havia espaço para algo novo em si.

Ao iniciar uma nova aurora, viu-se surpreendida por um belo lobo que a aguardava diante da porta de casa, este olhava-a como se desejasse fundir-se com ela. Acompanhou-a na sua caminhada, com uma distância segura, até ao lugar de trabalho. Ao chegar, o familiar do chacal cerra o olhar e com um uivo entra pela floresta próxima voltando a confrontá-la com um olhar chamativo.

Isabel inicia o seu ofício junto da única janela que lhe permite relembrar o exterior, diante da qual surge um esquilo. O roedor captou a sua atenção, até que o vento trouxe um pedaço de revista onde se via uma mancha escrita da qual se destacavam as palavras “viva” e “verdade”. Ao lê-las paralisou. Sentiu-se sufocar. Precisava inalar oxigénio puro. Terminado o seu dia no escritório, a jovem mulher sai, e lembra-se do lobo que a visitara de manhã. Com as pernas trémulas decide avançar para o bosque, temendo um encontro pouco seguro com o lobo, de alguma forma sentiu que precisava segui-lo.

Regelou ao confrontar-se com a neve desta época do ano entre a verdura que atravessava. À medida que entrava soltava-se de preocupações, noções de tempo e receios mesmo associados à sua sobrevivência. Andou por mais de duas horas numa crescente sensação de libertação de mãos dadas com o frio que se esquecia.

A dado momento encontra-se no meio de uma área circular limitada por altos ciprestes. Aí ela ouve docemente, dentro da sua mente, vozes que lhe dizem:

Aceita.

Aceita doce mulher.

Aceita a tua divindade interior e vive em uníssono com ela.

Atordoada com a experiência, sentia-se mais acompanhada do que se estivesse numa sala repleta de gente. Apesar do frio exterior ela vivia um estado de ebulição interior. Experienciou diversas sensações físicas e tonturas, quando a cabeça deixou de andar à roda abriu os olhos e reencontrou o majestoso lobo com os olhos a ferver por testemunhar o episódio. Segura de si, ligada a todas as formas de vida que a rodeavam, regressou para casa sentindo-se carregada como se fosse a chaminé de um


vulcão ancorada à imensa força da respetiva câmara magmática.

Ao regressar a casa apenas agradecia. Agradecia por ter encontrado a prenda desejada. O reconhecimento de uma essência até então adormecida e sem validação. Agradecia e pedia que os espíritos da terra e os espíritos celestes continuassem a ter espaço junto de si, pois testemunhou a sua contemplação de amor próprio, e, assim apela que se permita viver sempre num momento de Natal interior, data de nascimento e renascimento da divindade.


Deixa que Deus brilhe cada vez mais em ti. Começa hoje, começa, neste Natal.


Helena Brou Gomes"


Brou Gomes, H. et al.(2019). NATAL EM PALAVRAS, coletânea de contos de natal vol II. Tomo I. Lisboa: Chiado Books


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